Guia de boas práticas para a cobertura informativa televisiva de guerras e conflitos armados

Conselho Regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

a)  Considerando que a guerra na Ucrânia vem ocupando largamente o espaço mediático, em particular o noticioso, e que, desde o início da invasão da Ucrânia pela Rússia, a 24 de fevereiro de 2022, deram entrada na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (adiante ERC) várias participações sobre a cobertura jornalística televisiva da guerra;
b)  Considerando os resultados da análise realizada pela ERC;
c)  Considerando que o artigo 27.o da Lei da Televisão e Serviços Audiovisuais a Pedidoadota regras específicas para os conteúdos transmitidos em serviços noticiosos, garantindo que, em determinadas circunstâncias, podem ser transmitidos conteúdos suscetíveis de influir de modo negativo na formação da personalidade de crianças e jovens, nomeadamente aqueles que contenham violência;
d)  Considerando que este regime especial, relativo aos serviços noticiosos, reflete a relevância do direito de informar, mas não legitima, por si, a exibição de todo e qualquer tipo de imagens, sons e relatos;
e)  Considerando que podem ser considerados violentos os conteúdos que contenham imagens, sons e/ou relatos suscetíveis de provocar, de acordo com um padrão de avaliação médio, perturbação nos espectadores, em particular crianças e jovens;
f)  Considerando que a violência dos conteúdos pode resultar de opções editoriais que reforcem marcadamente a componente emotiva associada ao relato, imagens e/ou sons;
g)  Considerando, em todo o caso, que são violentas as imagens que exibam cadáveres, ferimentos expostos ou pessoas em sofrimento sem tratamento editorial adequado;
h) O Conselho Regulador, ao abrigo das suas atribuições e competências, considera relevante dirigir as seguintes recomendações aos órgãos de comunicação social, em especial aos serviços de programas televisivos, relativas à cobertura informativa de guerras e conflitos armados, exortando-os ao seu acolhimento:

  1. As imagens, os sons e os relatos da guerra que tenham cariz violento podem ser transmitidos quando necessários à compreensão do acontecimento, informação, comentário ou opinião, desde que sejam respeitadas as normas éticas aplicáveis.
  2. A exibição, quando justificável, de imagens, sons e relatos da guerra que tenham cariz violento deve ser precedida de advertência expressa que permita a decisão atempada de visionamento, ou não, dos conteúdos em causa.
  3. É igualmente recomendável, sempre que se justifique, a indicação escrita permanente no ecrã de que os conteúdos têm cariz violento.
  4. Deve também ser evitada a exibição de imagens, sons e relatos de cariz violento em promoções a peças que irão ser transmitidas ao longo do alinhamento.
  5. A possível exacerbação dos acontecimentos através de relatos, imagens e/ou sons que reforcem marcadamente a sua componente emotiva deve ser cuidadosamente avaliada e, quando suscetível de afetar a sua compreensão racional, evitada.
  6. A exibição sucessiva (em repetição) de imagens violentas deve ser evitada, incluindo nos ecrãs fracionados.
  7. Se a exibição de imagens de cariz violento em ecrã fracionado for indispensável, deve ocorrer em estrito cumprimento das normas éticas aplicáveis, antecedida de uma advertência expressa e acompanhada de uma indicação visual sobre a natureza violenta dos conteúdos.
  8. De forma a proteger a imagem dos mortos e de feridos graves e a intimidade familiar, é recomendável que os mesmos sejam filmados à distância ou com algum tratamento de imagem, devendo os rostos, ou quaisquer outros elementos que permitam a sua identificação, surgir ocultados.
  9. Na exibição de declarações de pessoas em manifesta situação de vulnerabilidade física, emocional ou psicológica, deve procurar-se, independentemente do seu eventual consentimento, preservar a sua identidade e garantir a sua segurança.
  10. De forma a cumprir o dever dei nformar com rigor e isenção, os órgãos de comunicação social devem diversificar as fontes de informação e contextualizar os acontecimentos.
  11. Considerando as dificuldades em obter, em contextos de guerra, informação fidedigna, os órgãos de comunicação social devem manifestar perante os espectadores as incertezas ou indeterminações que, eventualmente, se coloquem, evitando a veiculação de factos não confirmados e de propaganda das partes em conflito.
  12. Devem ser sempre identificados no ecrã as datas, os locais e a origem das imagens exibidas, inclusive as de arquivo, de forma a não induzir falsas perceções nos espectadores e a cumprir as exigências de rigor informativo no que toca à identificação das fontes de informação.
  13. Os órgãos de comunicação social devem assegurar a idoneidade e a atualidade de imagens ou discursos provenientes de fontes de informação oficiais e não oficiais de forma a não veicular conteúdos de desinformação.
    Lisboa, 25 de maio de 2022